União Europeia contra o uso de plásticos descartáveis!

 
Andrei Ciobanu

Andrei Ciobanu

      O problema do lixo marinho é hoje um problema global e de extrema gravidade, caminhamos para uma era em que haverá mais plástico do que peixes no oceano. Plásticos que representam hoje 85% do lixo marinho, que chegam já aos nossos pulmões, às nossas mesas, e cujo o impacto ao nível da saúde é ainda desconhecido. É mau. 

      Felizmente, a Comissão Europeia parece estar desperta para este problema e isso constitui um enorme passo na direcção certa. Ainda que com algumas lacunas, mas um passo louvável.            
      A Comissão Europeia propõe, assim, novas regras para toda a UE no que diz respeito aos 10 produtos de plástico descartável mais encontrados nas nossas praias e nos nossos mares. São eles:

     Cotonetes, talheres, palhinhas e pratos descartáveis: deverão ser substituídos por alternativas mais sustentáveis; 

    Pauzinhos de balões e os balões (claro!): os pauzinhos deverão ser substituídos por uma alternativa mais sustentável e os produtores de balões terão de contribuir para a sensibilização do problema do plástico, limpeza, recolha, tratamento de resíduos e uma nova rotulagem, com informação clara e transparente, alertando para o impacto ambiental negativo do produto e as suas opções de reciclagem;

    Embalagens de take-away, copos descartáveis e garrafas de plástico: deverão promover uma redução do seu uso, produtores terão de contribuir para a sensibilização do problema, limpeza, recolha e tratamento de resíduos;

     Beatas: produtores terão de contribuir para a sensibilização do problema, limpeza, recolha e tratamento de resíduos de todas as beatas e outros filtros que contenham plástico;

     Sacos de plástico: produtores terão de contribuir para a sensibilização do problema, limpeza, recolha e tratamento de sacos de plástico em adição a medidas já existentes na directiva que visa a redução do uso dos mesmos; 

     Pacotes de plástico e invólucros: produtores terão de contribuir para a sensibilização do problema, limpeza, recolha e tratamento de resíduos;

     Toalhitas e itens de higiene pessoal: deverão ter nova rotulagem, com informação clara e transparente, alertando para o impacto ambiental negativo do produto e opções correctas de reciclagem. Produtores terão de contribuir para a sensibilização do problema, limpeza, recolha e tratamento de resíduos;

      Artes Piscatórias: Produtores de produtos ligados à arte piscatória, contendo plástico, serão convocados a cobrir os custos de recolha de resíduos desde as Instalações Portuárias para Recepção de Resíduos - o seu transporte e tratamento. Cobrirão, também, os custos das medidas de sensibilização.

James Carol Lee

James Carol Lee

    Fico mesmo feliz com estas notícias, são um rasgo de esperança. Cada vez que se toca neste assunto, seja em redes sociais seja por qualquer outro meio de comunicação, é um ponto a favor nesta luta que outrora parecia inglória. É um orgulho imenso ver projectos irmãos como A Face Verde, a minimalista, a Ana, Go Slowly aparecerem cada vez mais, passando a palavra, mostrando como se faz a diferença. É coisa que arrepia dos pés à cabeça, mas em bom!  
     
      Impulsionada pela inspiração, aqui vos deixo o meu humilde contributo: durante a semana iniciarei convosco uma série de partilhas com alternativas low waste a alguns dos produtos mais comuns nas nossas casas. Fiquem atentos! 

      Enfrentar este problema é uma obrigação comum a todos, juntos, ainda é possível fazer a diferença.

      

Posso (re)começar um blogue assim? // o início desta "Garagem"

      A vida é maravilhosa.
      (posso começar um blogue assim?)

      Já queria ter começado a escrever-vos há algum tempo, mas os começos deixam-me muito ansiosa e fui adiando a coisa o mais que pude - algum procrastinador por aí?

      A verdade é que andava sem grande inspiração. Tinha o tema: queria falar-vos sobre Economia Circular, mas não sabia como raio a ia introduzir. Há umas semanas, um amigo enviou-me umas fotos que tirou em casa dos avós, foi o bastante para tudo em mim estremecer, tinha de parar e agarrar na caneta o quanto antes, toda uma inspiração súbita. Qualquer coisa de único, de sublime, naquelas imagens, algo que só existe nas casas antigas, nos móveis carregados de histórias, na disposição dos biblots que diz tanto das suas pessoas ou no pó da casa desabitada a afirmar a ausência. Percebi que era aquilo, só falando da minha experiência é que poderia vir falar deste tema convosco.

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      O conceito de Economia Circular entrou na nossa vida quando comecei a ler tudo o que conseguia sobre zero desperdício, o que coincidiu com a nossa mudança para a casa “nova”. Aliado a esta paixão por peças antigas, não foi difícil tomar decisões quanto ao que ia entrar cá em casa: tudo o que pudéssemos salvar do recheio da casa que compráramos e tudo o que já tínhamos - evitando, assim, comprar novo. O resultado foi uma casa eclética que tem tanto de nós como da sua própria história. Restaurámos o que precisava de restauro, demos nova vida a objectos que de outra forma iriam para o lixo e tudo o que já não nos fazia sentido doámos a uma associação e oferecemos a amigos e familiares. Desta forma, contribuímos para uma economia circular.

      Esta economia é aquela que defende que tudo deverá ser produzido, consumido e, após consumo, continuar a gerar valor. Ou seja, um produto que mesmo em final de vida possa ser reciclado (inteiro, ou partes) e dar origem a um novo produto que entre novamente neste ciclo de produção-consumo-reciclagem. Desta forma evita-se que se extraiam mais recursos ao planeta - uma vez que passamos a usar o que já foi criado - e trava-se o desperdício

      Ainda ando com as fotos ao peito, as da casa dos avós do Marco.  É aconchego, é amor, é o cheiro a bolachas acabadas de fazer, a janela aberta para a luz do dia, é tudo aquilo que as coisas antigas carregam consigo: histórias, e de como podemos resgatá-las para a nossa própria história dando-lhes nova vida e amor. Salvamo-nos a nós próprios e o planeta agradece. 
      Esta foi a forma sustentável que encontrámos para a nossa casa e que levamos para a vida, é tão simples quanto fazer do velho, novo!

      A vida é mesmo maravilhosa, não é?

Learning by Heart

My heart born naked
was swaddled in lullabies.
Later alone it wore
poems for clothes.
Like a shirt
I carried on my back
the poetry I had read.

So I lived for half a century
until wordlessly we met.

From my shirt on the back of the chair
I learn tonight
how many years
of learning by heart
I waited for you.

John Berger
(5/11/26 - 2/1/17)

//

O meu coração nasceu nu,
logo em fraldas embalado.
Só mais tarde usou
poemas em vez de roupas.
Tal como a camisa que punha
levava sobre o corpo
a poesia que lera.

Vivi meio século assim
até que, sem uma palavra, nos encontrámos.

A minha camisa nas costas da cadeira
diz-me que hoje percebi
quantos anos
a decorar poemas
esperei por ti.

John Berger,
"E os nossos rostos, meu amor, fugazes como fotografias"
quasi, 2008

trad. Helder Moura Pereira

Noutro tempo pousavas a tua mão

Noutro tempo pousavas a tua mão
No meu braço disponível
E sentia-te a vida pela ponta dos dedos
O teu coração solitário a palpitar na carne
Pelo sorriso...

Noutro tempo olhava a janela não como um buraco neutro
De onde é inútil sair ou enganar o olhar
E perdia-me nos teus cabelos a bailar a bailar
Essa magnificente vertigem que eram teus braços ansiosos

O dia ajuntava as partes de ti
E eu colecionava-te aos poucos
Descobrindo os teus recantos proibidos
Aonde beber de ti

Éramos um silêncio embriagado de gestos
Linguagem de um universo doméstico
Que não terminava de acontecer

Só os pássaros ou as estrelas nos igualavam...

Fugia então de ti por essas tardes fora
Correndo entre as urzes e as árvores silentes
Ouvindo-te os passos como um sussurro ardente
De teu corpo vadio buscando a minha pele

Era a ardência jovem dum suspiro
Uma febril meditação sobre o abismo

Perdia-me no tempo tentando ganhar a vida
E via teus cabelos crescerem dia a dia

A tua pele envelhecendo em rugas pequeninas
O final macabro que termina a festa

Era tudo tão dolorosamente lento
Vinte anos depois quase vinte séculos
Após vinte dias...

Tu eras já ninguém caindo pela rua
E eu mendigo roto esperando ternura!

 

João Maria do Ó Pacheco
Poemas I,
Editora Labirinto

 

 

Fotografia: Marco Gil