Feliz Alban Arthan / Yule!

Na noite mais longa do ano, celebramos Alban Arthan - da tradição druídica, “Light of Winter” -, o regresso da luz, o renascimento do Sol que trará com ele a luz e a vida à terra. O fim da escuridão. Se há ano em que mais precisamos do retorno desta luz, é este.

É tempo de renovação, de deixar o passado para trás e de saudar o novo. Tempo de Morte e de Renascimento, de largar, na escuridão, tudo aquilo que carregamos e que representa tudo o que não nos permite avançar. O que é verdadeiramente nosso e o que é de outros? O que é preciso largar?

E, na luz, trazer ao de cima, como uma semente que brota por debaixo da neve, a verdadeira essência. Honra o que morreu em ti, o que doeu e te fez crescer, devolve à terra. Traz luz ao que tens dentro

Em Alban Arthan a casa é decorada com visco e azevinho, plantas perenes - no geral - como os abetos, pinheiros etc. O verde das plantas simboliza a promessa de renovação e novo crescimento. Relembrando-nos que a Primavera já espreita e que, em breve, retornará à terra. Na tradição Irlandesa, as casas são decoradas com plantas para trazer um lugar de conforto e descanso, do frio e da escuridão, aos espíritos da Natureza. 

O Tronco de Yule faz parte das celebrações mais tradicionais do Solstício de Inverno, é queimado na lareira principal da casa, e deve vir da própria terra ou como um presente, não deve ser comprado. Tradicionalmente, deverá ser aceso com um pedaço do restante tronco de Yule do ano anterior, simbolizando a luz que é passada de um ano para o outro. O tronco de Yule deverá queimar lentamente por 12 dias, na lareira, antes de se apagar. As cinzas deverão ser guardadas e, na primavera, misturadas com as sementes e levadas para o campo. Como o poder do Sol, simbolizado no tronco de Yule e distribuído pela terra. O que sobra deverá ser guardado até ao próximo ano, para acender o novo tronco. O nosso tronco de Natal, em formato de bolo, é ainda símbolo desta tradição antiga. 

O meu altar ainda não está pronto. Confesso que, por estes dias, tenho andado mais desligada, mas está tudo bem, comemorar a roda do ano é um lembrete para nos trazer de volta à natureza, a nós mesmos, a quem veio antes de nós, mesmo no meio dos dias que correm - especialmente nesses. É por isso que gosto de marcar cada um destes dias. Parar, a cada um deles, para me relembrar daquilo de que sou feita, para fazer balanços, para semear intenções e sonhos. Para honrar a terra que piso e o que ela me traz.

Se não tens por costume o celebrar da roda do ano, que este ano, ao te sentares na mesa de Natal, possas meditar sobre a origem do tronco de Natal e de como chegou à tua mesa.

Percebe como a luz retorna sempre, ano após ano, e que não há escuridão que perdure.

 

We open our hearts to joy, optimism and goodwill – the brightest lights in the darkest night – warming our souls next to the sustaining heat of those we love; sharing our gifts, our laughter and our time, knowing the season of darkness shall slowly fade, that the Goddess shall birth new life from death; warmth from cold.”

- Maria Ede-Weaving

Photo by Annie Spratt on Unsplash

A Roda do Ano Celta (revisto em 2025)

Nota de actualização — Outubro 2025

Este texto foi originalmente escrito em 2020, quando comecei a explorar o que então conhecia como “a Roda do Ano Celta”.

Nos anos que se seguiram, o caminho ensinou-me que parte da informação que partilhei era uma leitura contemporânea - sobretudo inspirada pela Wicca e por correntes neopagãs do século XX - mais do que um reflexo fiel do que sabemos historicamente sobre os povos celtas.

Mantive o texto, com algumas revisões, porque ele marca uma fase bonita e honesta do meu percurso. Acrescentei apenas o que aprendi entretanto: que a “Roda do Ano” como a conhecemos hoje é uma síntese moderna, criada a partir de tradições sazonais antigas mas reinterpretada através da espiritualidade moderna - incluindo o Druidismo contemporâneo, como o da Order of Bards, Ovates & Druids (OBOD), onde encontrei mais tarde uma casa mais fiel à minha própria sensibilidade.

A verdade é que tudo vive, também, em revisitação. Escrever - e reescrever - é parte do ciclo. 🌙

A Roda do Ano


A primeira vez que ouvi falar na Roda do Ano foi quando comecei a ler sobre o povo Celta. Cheguei aos Celtas porque sentia necessidade de prestar homenagem à terra que piso e aos que vieram antes de mim.

Ser Portuguesa tem muito que se lhe diga - foi o cabo dos trabalhos meter-me nisto de “honrar antepassados”. Cheguei a pensar muitas vezes: “Onde raio me vim meter?” - e lembrei-me das aulas de História onde só participava de corpo presente. Ter-me-ia dado jeito, agora.

Temos um património genético que só faz lembrar o jantar de domingo à noite: ele é Celtas (Lusitanos, Galaicos e Cónios), Gregos, Fenícios, Romanos, Cartagineses, Suevos, Visigodos, Mouros, Árabes… uma salganhada bonita. Por isso, quando quis olhar para trás, tive de fazer uma escolha.

Em vez do “um-dó-li-tá” , olhei para a minha família. E percebi que, não negando a costela alentejana de Grândola, as raízes dominantes são Ribatejanas e de Transmontanas. A escolha caiu nos Celtas - vá, eu estava a torcer por isso, só precisava de uma justificação plausível ahaha.

Não há como negar a presença Celta em Portugal. Muitas das nossas festas tradicionais guardam ainda ecos pagãos, sobretudo no Norte do país - festas da colheita, fogueiras, danças sazonais. Mas é importante lembrar: a estrutura da Roda do Ano, com oito festivais marcados e nomes fixos, é uma criação moderna, inspirada nesses ritmos antigos mas reconstruída no século XX por correntes neopagãs (como a Wicca) e pelos movimentos de renovação druídica.

ilustração do livro Wicca, Harmony Nice

ilustração do livro Wicca, Harmony Nice

Entre essas tradições modernas, o ano divide-se simbolicamente em duas metades - a luminosa e a escura - e quatro estações, celebradas através de oito festivais:

🌙 Samhain (31 de Outubro) – o portal do Inverno e o novo ano celta (não defendido por Ronald Hutton, a visão do novo ano celta é uma visão contemporânea)
🌙 Imbolc (1 de Fevereiro) – o tempo dos começos e dos nascimentos.
☀️ Beltane (1 de Maio) – a união do fogo e da terra, o florescimento da vida.
☀️ Lughnasadh (1 de Agosto) – a primeira colheita e o agradecimento à abundância.

E, entre estes, os Solstícios e Equinócios:
🌞 Alban Arthan (ou Yule, o Solstício de Inverno), Alban Eilir (ou Ostara, o Equinócio da Primavera), Alban Hefin (ou Litha, o Solstício de Verão) e Alban Elfed (ou Mabon, o Equinócio do Outono).

O meu altar de Lugnasadh (ou Lammas), que se comemorou no passado sábado.À falta de uma mesa cheia, e à luz de uma pandemia, celebrei-o online com as minhas magas, a Joana do Ninho e a Joana do Vento.

O meu altar de Lugnasadh (ou Lammas), que se comemorou no passado sábado.

À falta de uma mesa cheia, e à luz de uma pandemia, celebrei-o online com as minhas magas, a Joana do Ninho e a Joana do Vento.

Estes nomes e datas foram sistematizados mais recentemente, mas reflectem - de forma simbólica e bela - os ciclos que sempre orientaram a vida humana: o nascimento, o crescimento, a colheita e o repouso.

Para mim, celebrar a Roda do Ano é celebrar o tempo da terra e o meu próprio tempo interior. Cada festival lembra-me que sou natureza, e que o tempo não é linear, é circular.

Honrar estes ciclos devolve-me ao respeito pelo ritmo das coisas. Recorda-me que o tempo tem o tempo que o tempo tem.

Honra.









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Fontes e leituras recomendadas:
– Ronald Hutton, The Stations of the Sun: A History of the Ritual Year in Britain (Oxford University Press, 1996)
– OBOD , The Eightfold Wheel of the Year and Festivals (druidry.org)