Escrevo-te para não me sentir só.


escrevo-te para não me sentir só. risco a palavra capaz de revelar o meu segredo. terei segredos? revelar o quê? se posso rir de mim mesmo sem que isso me doa. apago rapidamente o texto que me reflecte. esfaqueio o rosto que me simula. alinhavo feridas nos pulsos. levo flores à sepultura onde me recolhi para escrever. tenho medo e escrevo-te cartas insensatas. o quarto povoa-se de corpos nascidos duma mancha de tinta. fumo. snifo. fumo cigarro atrás de cigarro. tenho medo. escrevo deitado à luz fraca do candeeiro. o medo solta-se da folha de papel quando teu reflexo irrompe da máscara que se desfaz.

al berto
push here com uma polaroid
Assírio & Alvim 

Não fui margem sem outra margem onde ligar os braços.


Não fui margem sem outra margem onde ligar os braços
Mas fui o tempo solto para entrançar os meus cabelos
E o movimento dos teus pés descalços

Não fui a solidão inteira nem reclusa
Para o único repouso entre o silêncio
Nem fui a flor exausta defendendo-se
De toda a mão que a quis despetalar

Não fui a casa que a si mesma se abrigou
Nem a morada que nunca se acolheu
Mas o tempo a pedir que me deixasse

Naquilo que não fui vim encontrar-me
E sempre que te vi recomecei


Daniel Faria 
Poesia,
quasi